Fortuna dos 1% mais ricos poderia acabar com pobreza global 22 vezes, mostra Oxfam

Fortuna dos 1% mais ricos poderia acabar com pobreza global 22 vezes, mostra Oxfam

Relatório revela que fortuna de elite global aumentou em US$ 33,9 trilhões em dez anos, agravando desigualdade social

A fortuna dos 1% mais ricos do mundo seria suficiente para eliminar a pobreza global anual 22 vezes, mostra o novo relatório “Do Lucro Privado ao Poder Público: Financiando o Desenvolvimento, Não a Oligarquia”, divulgado, nesta quinta-feira (25), pela Oxfam, organização de combate à pobreza.

O documento mostra que os mais ricos aumentaram suas fortunas em US$ 33,9 trilhões (cerca de R$ 185 trilhões) nos últimos dez anos. Só a fortuna dos bilionários, que são cerca de 3 mil pessoas, aumentou em US$ 6,5 trilhões, mais do que o custo anual para atingir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos pela ONU e estimados em 4 trilhões. Enquanto isso, 3,7 bilhões de pessoas vivem abaixo da linha de pobreza de US$ 8,30 por dia (cerca de R$ 45), de acordo com dados do Banco Mundial.

O relatório foi divulgado às vésperas da 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento, maior evento sobre o tema da última década, que acontece em Sevilha, Espanha, na próxima segunda-feira (30).

Além de criticar a estratégia de priorizar investidores privados, o que beneficiou os mais ricos (os 1% detêm 43% dos ativos globais), a Oxfam também denuncia que os países ricos estão realizando os maiores cortes em ajuda humanitária desde 1960.

Os países do G7, responsáveis por 75% da ajuda oficial, reduzirão seus repasses em 28% até 2026. Enquanto isso, a crise da dívida está levando governos à falência: 60% dos países de baixa renda estão à beira do colapso, gastando mais com credores do que com saúde e educação. Apenas 16% das metas dos ODS estão no rumo certo para 2030.

“Sevilha é o primeiro grande encontro global em um momento em que a ajuda humanitária está sendo destruída, uma guerra comercial começou e o multilateralismo está em frangalhos – tudo sob o pano de fundo do segundo governo Trump. O desenvolvimento global está falhando porque os interesses de uma minoria super-rica são colocados acima de todos os outros”, disse Amitabh Behar, diretor-executivo da Oxfam Internacional.

Behar ainda acrescentou que os países ricos colocaram Wall Street no comando do desenvolvimento global. “É uma tomada do poder pelo setor financeiro privado, que suplantou as formas comprovadas de combater a pobreza por meio de investimentos públicos e tributação justa”, declarou.

Para ele, diante desse cenário, não é surpresa que os governos estejam “desastrosamente” fora do rumo, seja na promoção de empregos dignos, igualdade de gênero ou fim da fome. “Essa concentração de riqueza está sufocando os esforços para acabar com a pobreza“, afirmou Behar.

O diretor também destacou que existem trilhões de dólares para cumprir as metas globais, mas que estão trancados em contas privadas dos super-ricos. “É hora de rejeitarmos o Consenso de Wall Street e colocarmos o setor público no comando. Os governos devem atender aos amplos apelos para taxar os ricos – e combinar isso com uma visão para construir bens públicos, da saúde à energia. É um sinal esperançoso que alguns governos estejam se unindo para combater a desigualdade – mais países devem seguir seu exemplo, começando em Sevilha”, disse Behar.

Brasil: retrato do fracasso do atual modelo de desenvolvimento global

Para a diretora executiva da Oxfam Brasil, Viviana Santiago, o Brasil é um “retrato escancarado do fracasso do atual modelo de desenvolvimento global, que prioriza lucros privados em vez do bem-estar coletivo”.

“A extrema concentração de riqueza no topo, alimentada por um sistema tributário injusto e regressivo, aprofunda desigualdades históricas de raça e gênero. São as mulheres negras, indígenas e periféricas que pagam o preço mais alto da crise climática, da fome e do desmonte dos serviços públicos”, afirmou ela.

Santiago defendeu que é preciso, urgentemente, um pacto global baseado em justiça tributária, fortalecimento do setor público e reparação histórica.

Os trilhões acumulados pelos super-ricos, inclusive no Brasil, não podem mais ser blindados. A população já sinalizou que 9 em cada 10 brasileiras e brasileiros apoiam taxar fortemente os mais ricos para financiar saúde, educação e ação climática.

Propostas da Oxfam para combate à desigualdade

Diante desse cenário, a Oxfam propõe aos governos algumas políticas que podem promover uma mudança de rumo, combatendo a desigualdade extrema e transformando o sistema de financiamento do desenvolvimento. São elas:

  • Novas alianças estratégicas contra a desigualdade: Os governos devem se unir em novas coalizões para se opor à desigualdade extrema. Países como Brasil, África do Sul e Espanha estão oferecendo liderança para isso internacionalmente. Uma nova “Aliança Global Contra a Desigualdade”, apoiada por Alemanha, Noruega, Serra Leoa e outros, serve de exemplo para que outras nações apoiem.
  • Abordagem “público primeiro” – rejeitar o Consenso de Wall Street: Os governos devem rejeitar o financiamento privado como a solução mágica para o desenvolvimento. Em vez disso, devem investir em desenvolvimento liderado pelo Estado – para garantir serviços universais de saúde, educação e assistência de alta qualidade – e explorar bens públicos em setores como energia e transporte.
  • Repensar totalmente o financiamento do desenvolvimento: Taxar os super-ricos, revitalizar a ajuda humanitária, reformar a arquitetura da dívida e ir além dos indicadores de PIB. Os doadores do Norte Global devem reverter urgentemente os cortes catastróficos à ajuda vital e cumprir a meta de 0,7% de AOD (Ajuda Oficial ao Desenvolvimento) como mínimo. Os governos devem apoiar uma nova convenção da ONU sobre dívida e a convenção tributária da ONU, aproveitando o esforço do G20 liderado pelo Brasil para tributar indivíduos com alto patrimônio.

 

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