Esses edifícios criarão caos no trânsito e nos serviços públicos no entorno do Parque dos Poderes

A vereadora Luiza Ribeiro (PT), integrante da Comissão Permanente de Meio Ambiente da Câmara Municipal de Campo Grande, concedeu entrevista ao Correio do Estado para falar do risco da instalação de empreendimentos verticais na região do entorno do Parque dos Poderes.
Ela reforçou que a proteção ambiental do Parque Estadual do Prosa, do Parque das Nações Indígenas e do Parque dos Poderes sempre esteve na pauta dos ambientalistas, que não vão deixar que ocorra a instalação de empreendimentos imobiliários verticais na região.
Vereadora, em que pé está hoje o debate sobre as construções verticais na área de amortecimento do Parque Estadual do Prosa?
A proteção do Parque Estadual do Prosa, do Parque das Nações Indígenas e do Parque dos Poderes sempre esteve na pauta dos ambientalistas e das pessoas que querem uma cidade com desenvolvimento, mas com respeito tanto às normas ambientais como às normas urbanísticas. Então, nós passamos uns anos discutindo sobre a pretensão do governo estadual e do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) de fazerem construções dentro do Parque dos Poderes. Graças a Deus, tivemos uma decisão judicial favorável a não construção naquele parque.
Agora, nos surpreendemos com decisões, que começaram a ser proferidas pela Planurb [Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano]desde o ano passado, que autorizam a construção de vários empreendimentos imobiliários verticais de muitos apartamentos ou salas comerciais exatamente na chamada zona de amortecimento do Parque Estadual do Prosa.
Esse parque é uma reserva ambiental legalizada em Mato Grosso do Sul, incluído em um sistema nacional de Unidades de Conservação, e tem uma proteção especial, não sendo permitida, pelas legislações federal, estadual e municipal, a edificação concentrada naquela região porque isso traz impactos à natureza.
Nós temos uma fauna muito vasta lá, temos mais de 250 espécies de pássaros catalogadas ali que precisam de correntes migratórias para estarem aqui na nossa cidade, portanto, há todo um elemento, um arcabouço legal que proíbe que essa área seja utilizada como qualquer outra área da cidade para intensa verticalização de construções.
O Plano Diretor de Campo Grande, que é uma lei municipal, também compreende aquela área, chamada de Zona 3, como não própria para intensa urbanização. Ao contrário, ali é uma área que admite moradia, que admite construção de empreendimentos, mas não o adensamento populacional alto, por isso, o Plano Diretor de Campo Grande é uma norma que direciona para onde a cidade deve crescer, e o adensamento populacional está indicado para as zonas 1 e 2. A Zona 3, que é exatamente onde está a região do Parque Estadual do Prosa, não é uma área que está destinada ao adensamento populacional.
Por isso, nós estamos vendo a prefeitura, em vez de ser um órgão fiscalizador e regulador do adequado crescimento da cidade, fazer o contrário, criando ilegalidades com as permissões que autorizam as grandes construtoras a erguerem prédios verticais.
Fomos surpreendidos com a permissão de mais de 20 empreendimentos imobiliários de alta densidade populacional, o que vai provocar um impacto ambiental e urbanístico muito grave naquela região. Além de ser um prejuízo para aquelas pessoas que são, vamos dizer assim, iludidas com a compra de uma moradia, que é um imóvel caro e de alto padrão.
Esses edifícios criarão caos no trânsito e nos serviços públicos do entorno do Parque dos Poderes, pois aquela região não está estruturada para um grande adensamento populacional, o que, em vez de valorizar a propriedade, vai ser um problema para os proprietários desses apartamentos.
Por isso nós estamos alertando a sociedade para que não caia nessa conversa de que vai comprar um apartamento de padrão alto na região do Parque dos Poderes e terá uma vantagem patrimonial. Isso não é verdade. A cidade vai ter um prejuízo ambiental e urbanístico, enquanto o dono de imóvel vai ter o seu bolso lesado, se fizer um investimento nessa área.
Na sua avaliação, esses empreendimentos verticais podem trazer danos irreparáveis para a preservação ambiental e desrespeitar o Plano Diretor de Campo Grande?
Impulsionados pela reclamação de ambientalistas, arquitetos e construtores mais conscientes, a Câmara Municipal de Campo Grande fez, por meio da Comissão do Meio Ambiente – eu fui a proponente –, fez uma audiência pública no dia 4 de abril deste ano.
Como resultado dessa audiência pública e de algumas representações, o MPMS, por meio de duas promotorias ambientais, expediu recomendações, tanto ao governo como à Prefeitura de Campo Grande, para que realizassem várias ações de proteção a essa região e também de cumprimento das determinações urbanísticas, especialmente a Planurb, para que cessem imediatamente e suspendam licenças já concedidas para qualquer novo empreendimento vertical nessa região, para evitar disputas judiciais e outros prejuízos à cidade e aos investidores.
Essa expansão imobiliária na região já é alvo de investigação do MPMS, que instaurou um inquérito civil para avaliar as consequências dessa verticalização. Quais os desdobramentos disso?
O Ministério Público já instaurou vários procedimentos para investigar aspectos ambientais e também aspectos urbanísticos, e o primeiro efeito foi a expedição conjunta, por duas promotorias diferentes, de recomendações ao Estado e ao município.
Essas recomendações foram expedidas no dia 8 de abril, estão publicadas no Diário Oficial, e esses órgãos já foram intimados. Como são recomendações estruturantes, foi concedido prazo de 60 dias para que essas autoridades, tanto o governador Eduardo Riedel [PSDB], como o secretário de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação, Jaime Verruck, bem como a prefeita Adriane Lopes [PP] e a diretora-presidente da Planurb, Berenice Maria Jacob Domingues, possam se manifestar quanto ao cumprimento das determinações.
Por enquanto, nós estamos aguardando as respostas e movimentando a sociedade em torno de conhecer esse problema que a cidade passa, porque muita gente não tem conhecimento desta situação, e, a partir da informação, se mobilize, assinando um abaixo-assinado que pede exatamente para que não sejam feitas construções verticais que adensem aquela região de forma a colocar em risco a natureza e a vida urbana.
Moradores dos bairros Santa Fé, Chácara Cachoeira, Jardim Veraneio e Carandá Bosque estão se mobilizando para evitar que esses empreendimentos verticais cheguem nas suas regiões, que atualmente são residenciais. Como é possível ajudá-los?
O morador da região é o mais importante, o morador da cidade é o mais importante, porque as pessoas são as personagens que devem ser protegidas no contexto da construção de uma cidade. Então, é muito bonito ver os moradores se reunirem em associação, buscarem saídas, como provocar o Ministério Público, provocar a Câmara Municipal e participar de audiências lá na prefeitura.
Nós estamos apoiando esse movimento dos moradores da forma que a Câmara pode apoiar, abrindo o debate e criando condições de um amplo diálogo, mas também assessorando tecnicamente os moradores quanto ao direito deles e quanto ao dever da administração, que é exatamente o que nós estamos questionando.
Neste momento, a Prefeitura de Campo Grande está promovendo, de uma forma irresponsável, um adensamento naquela região, que prejudica o proprietário morador, que prejudica o meio ambiente, que prejudica o futuro da cidade, e nós não podemos permitir isso, porque os impostos são pagos para a prefeitura para que ela organize os serviços cumprindo a lei federal, municipal e estadual. E o que nós estamos vendo é que a Prefeitura, sei lá por qual interesse, está promovendo autorizações para as construtoras fazerem empreendimentos imobiliários verticais ali, sem nenhuma condição legal, ambiental ou urbanística.
Mesmo com todos esses riscos, mais de 20 empreendimentos verticais foram liberados para essa região. A senhora acredita que há um lobby das grandes construtoras de edifícios residenciais que atuam em Campo Grande para explorar essas regiões?
Na audiência pública que realizamos, convidamos as apresentações dos consultores que estiveram na Casa de Leis e, naturalmente, fizeram a defesa do ponto de vista deles, que eles entendem que é possível a construção de tantos prédios verticais lá na região da zona de amortecimento do Parque dos Poderes.
Nós não podemos provar ou indicar qualquer indício de que há, por parte destas empresas, lobby de convencimento de servidores ou de gestores para as liberações sem observância da lei. Mas isso está a cargo do Ministério Público observar. Aqui, na Câmara Municipal, por enquanto, ainda não chegou para nós nenhuma denúncia ou indício que possa indicar um comportamento, seja da prefeita, seja das equipes que despacham nesses processos, que autoriza as construções ou qualquer desvio direto na conduta do servidor.
É claro que a gente tem sempre de observar. Até agora nós estamos tomando as decisões da prefeitura como equívocos, decisões equivocadas que precisam ser corrigidas, e não diretamente como uma conduta ilícita do servidor público por meio de convencimento sendo feito de maneira não determinada pela lei. O servidor público tem que dar uma decisão com base no seu entendimento e aplicar as leis que estão vigentes no País e aqui em Campo Grande.
Nós não podemos imaginar que servidores públicos da prefeitura ou a própria prefeita tenham constituído qualquer tipo de relação com o setor produtivo da construção civil para burlar as leis e obter com isso vantagens econômicas.
Mudando de assunto, a senhora faz parte da CPI do Ônibus. Como o trabalho dessa comissão pode melhorar a qualidade do serviço prestado em Campo Grande?
A CPI é muito importante porque a Câmara é a representação da sociedade. As pessoas prestam muita atenção no que acontece aqui, no âmbito do Legislativo. E a CPI já era uma reclamação há muito tempo, porque a sociedade percebe um serviço de péssima qualidade, que custa caríssimo para Campo Grande, custa caro para os moradores, para os usuários, e o serviço não melhora, atrasando o desenvolvimento da nossa cidade.
Portanto, uma Comissão Parlamentar de Inquérito é capaz de mostrar para as pessoas quais são os gargalos que ocorrem verdadeiramente e como resolvê-los. Por isso, organizamos uma CPI que, na nossa opinião, está indo muito bem.
A primeira fase foi demonstrar para a sociedade quais são os problemas na gestão da prefeitura. Nós comprovamos que a prefeita e os prefeitos anteriores não fizeram a sua parte no que se refere ao cumprimento do contrato. Isso, eu estou falando da fiscalização dos serviços.
Só para você ter uma ideia, a CPI revelou que, durante 12 ou 13 anos de vigência desse contrato, apenas uma auditoria foi realizada e três estudos técnicos pontuais, o que significa que a prefeitura simplesmente não cumpriu a sua obrigação de fazer a regulação do serviço, fazer a fiscalização desse serviço e do prejuízo ao usuário, à cidade, ao nosso desenvolvimento.
Então, a CPI já traz transformações, porque ela mostra para a cidade os problemas, e já estamos tendo alguns resultados, como, por exemplo, a determinação recente da prefeita para que o consórcio, em 30 dias, e já vai vencer o prazo daqui a 15 dias, faça a substituição de 98 veículos. Até agora, nós não tivemos a resposta da empresa, mas esperamos que ela cumpra. Se não cumprir, que a prefeita tome a decisão que deve tomar.
Há um grande temor da população de que a CPI do Ônibus possa acabar em pizza. Como evitar que isso aconteça?
Essa é uma expressão muito usada quando tem CPIs, mas a tradição aqui da Câmara de Campo Grande é de ter feito sempre CPIs que tiveram muito resultado para a cidade. Eu me lembro da CPI do Câncer, do Hospital de Câncer, em que, inclusive, por coincidência, eu e o vereador Junior Coringa (MDB) trabalhamos juntos também.
Nós trouxemos mudanças estruturantes para a saúde das pessoas que estão com câncer em Campo Grande. Até hoje, as nossas decisões na CPI têm repercussões, com efeitos importantes para quem está com essa doença. Reorganizamos todo o serviço, no Hospital do Câncer, no Hospital Regional, no próprio HU [Hospital Universitário]. O Ministério Público entrou com ações e puniu, a Justiça fez ações criminais contra os responsáveis.
Portanto, nós temos uma tradição de ter bons resultados. Nessa CPI, nós também esperamos ter bons resultados. Vamos fazer um relatório em que constem todas essas questões. Aquilo que foi verificado como prevaricação, a gente já tem bem caracterizada a conduta ilegal do diretor da Agetran [Agência Municipal de Transporte e Trânsito]. Pedimos que a prefeita demita o diretor, e essa falta de ação dela pode gerar, inclusive, responsabilização, por não estar tomando a providência adequada.
Nós verificamos que o presidente da Agetran prevarica na ação pública que ele está lá para realizar, permitindo que os ônibus rodem com superlotação sem serem interceptados pela fiscalização. Além disso, também revelamos uma atividade de superexploração do trabalho dos empregados, e nós vamos levar ao conhecimento do Ministério Público do Trabalho, assim como vamos levar ao conhecimento do MPMS as demais condutas ilegais.
Então, achamos que podemos melhorar o transporte porque a sociedade se apropria das informações, não tolera mais aquelas ilegalidades, e aí as outras autoridades, inclusive do Poder Judiciário, vão buscar as alternativas para punir aqueles servidores que foram desidiosos com o contrato, tanto nesta gestão quanto nas anteriores. E também punir o consórcio pelas condutas ilegais.
Perfil – Luiza Ribeiro
Natural de Penápolis (SP), é formada em Direito Processual Civil e tem especialização em Gerência de Cidades pela Faculdade Álvares Penteado (Faap/SP). Foi superintendente do Procon-MS, quando fundou a Casa do Consumidor, secretária de Estado de Justiça e Cidadania no governo de Zeca do PT e presidente da Funsat de Campo Grande.
Exerceu seu primeiro mandato de vereadora em 2013. Em 2023, reassumiu um mandato na Câmara Municipal como suplente e, em 2024, foi a 12ª vereadora mais votada, reeleita com 4.982 votos.