Extinção de cotas raciais em Santa Catarina gera debate sobre privilégios e reparação histórica
A Assembleia Legislativa de Santa Catarina aprovou um projeto de lei que extingue as cotas raciais nas universidades estaduais, estabelecendo ainda punições financeiras para as instituições que mantiverem o sistema. O texto, que aguarda a sanção do governador, é defendido por parlamentares sob o argumento da meritocracia e da igualdade. No entanto, o bacharel em Direito Marlon Amorim argumenta que a decisão não é técnica, mas uma escolha política que preserva privilégios raciais historicamente consolidados no estado.
Segundo dados do Censo 2022, Santa Catarina possui quase 1,8 milhão de pessoas negras e mais de 20 mil indígenas, grupos que seriam diretamente afetados pela medida. O debate traz à tona a formação social catarinense, marcada por incentivos estatais à imigração europeia no século 19, enquanto populações negras e indígenas eram sistematicamente marginalizadas e excluídas do acesso à terra e à educação formal.
Raízes históricas da exclusão em Santa Catarina
O ensaio destaca que a narrativa de pioneirismo e esforço individual muitas vezes oculta a violência estatal contra povos originários e populações caboclas.
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Povos Indígenas: Grupos como Xokleng, Kaingang e Guarani sofreram processos de expropriação e genocídio que sustentaram a colonização. A disputa atual pelo Marco Temporal é um reflexo dessa estrutura permanente.
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Guerra do Contestado: Representou o extermínio simbólico e físico das populações caboclas em nome de interesses privados e do capital estrangeiro.
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Políticas de Branqueamento: O Estado investiu em crédito e infraestrutura para colonos brancos, estabelecendo uma hierarquia racial que ainda organiza o acesso ao poder e ao conhecimento.
O papel das cotas e a reação institucional
As políticas de cotas são descritas como uma tentativa mínima de correção histórica para mitigar desigualdades produzidas pelo próprio Estado. Dados do Inep e de diversas universidades demonstram que estudantes cotistas apresentam bons índices de desempenho e permanência, além de diversificarem a produção científica brasileira.
A resistência atual a essas políticas é vista por especialistas como uma reação à democratização da universidade pública. Quando esses espaços deixam de ser exclusivos de uma elite branca, tornam-se alvo de vigilância e ataques. Para Amorim, ao extinguir as cotas, o poder legislativo catarinense atua na prática como defensor de uma “ação afirmativa para brancos”, naturalizando disparidades sociais profundas em nome de uma igualdade abstrata.

