STJ Condena Associação Residencial por Restrições Abusivas a Moradores Não Associados

STJ Condena Associação Residencial por Restrições Abusivas a Moradores Não Associados

Associação impede acesso e o STJ estabelece limite de atuação em loteamentos

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu decisão condenatória contra uma associação residencial por práticas que impunham restrições de acesso a proprietários de imóveis que não eram filiados à entidade. O colegiado concluiu que essa conduta abusiva violou direitos de personalidade dos moradores, ao criar obstáculos reiterados para que eles ingressassem em suas próprias casas e recebessem visitas.

A relatora do caso, ministra Isabel Gallotti, reconheceu a caracterização de dano moral e determinou o pagamento de indenização de R$ 5 mil para cada autor da ação, acrescida de correção monetária e juros legais.

Restrições e Conduta Discriminatória

De acordo com o processo, a associação implementava uma série de medidas que afetavam diretamente a rotina dos moradores não associados, incluindo:

  • Impedimento de Entrada: A entidade proibia ou dificultava a entrada de visitantes, entregadores e prestadores de serviços solicitados pelos residentes.

  • Procedimentos Rigorosos: Moradores não associados eram obrigados a se submeter a procedimentos mais rigorosos e demorados para ingressar no próprio loteamento, como a identificação manual em todas as entradas.

  • Disparidade de Tratamento: Enquanto os associados usufruíam de métodos de acesso simplificados, como o uso de cartão eletrônico, os não associados eram constrangidos a um sistema manual e lento em todas as suas entradas.

A sentença inicial havia julgado os pedidos improcedentes. O Tribunal local, posteriormente, permitiu o ingresso apenas de profissionais considerados essenciais, mantendo o cerne das restrições, o que motivou o recurso ao STJ.

Voto da Relatora: Ilegalidade e Dano Moral

Em seu voto, a ministra Isabel Gallotti enfatizou que as áreas de circulação em loteamentos, mesmo aqueles com controle de acesso, mantêm a natureza de áreas públicas, conforme estabelecido pela Lei 6.766/79 (arts. 2º e 22). Este princípio impede a vedação generalizada ou a criação de entraves abusivos ao ingresso de terceiros (desde que identificados) que se dirigem a um morador.

A relatora destacou que a decisão do Tribunal de origem contrariou o texto legal ao autorizar limitações que iam além do controle de segurança, resultando em um verdadeiro impedimento ao pleno exercício da posse pelos proprietários.

A ministra considerou que a distinção estabelecida pela associação, que obrigava os não associados a se identificar manualmente em todas as entradas, configurava um meio indireto de constrangimento visando forçar a adesão à entidade, e não uma medida legítima de segurança.

A conclusão do voto foi categórica: os residentes não associados, sendo igualmente proprietários, têm direito ao cadastro e ao cartão de acesso, cabendo à associação ajustar seus meios de controle interno sem impor limitações àqueles que não aderiram à pessoa jurídica.

O dano moral foi reconhecido porque os autores enfrentavam constrangimentos reiterados para acessar suas casas e receber visitas, uma situação que, segundo a relatora, ultrapassa os meros aborrecimentos e configura uma violação injustificada aos direitos da personalidade.

Críticas do Colegiado: Discriminação e Abuso

O ministro Raul Araújo acompanhou o voto e fez uma intervenção enfática, classificando a conduta da associação como “absurdamente desarrazoada”. Ele ressaltou que impedir moradores de acessar a própria casa ou de receber entregas em condições desiguais às dos associados constitui tratamento discriminatório incompatível com qualquer justificativa de segurança.

O ministro concordou que o objetivo real da prática não era a proteção do loteamento, mas sim constranger e forçar os moradores a se filiarem à associação. Raul Araújo concluiu que, embora o controle de acesso seja legítimo, não se pode tolerar disparidade de tratamento entre associados e não associados, especialmente quando a prática interfere diretamente no direito fundamental de ir e vir e na fruição da propriedade.

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