Posso dizer que, entre as atribuições, vou me dedicar bastante à ação preventiva
Após longos anos de serviço prestado à política do Estado, o ex-secretário estadual da Casa Civil, Sérgio de Paula, foi nomeado conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul (TCE-MS) em substituição ao conselheiro Jerson Domingos, que se aposentou compulsoriamente.
Em entrevista exclusiva ao Correio do Estado, ele destacou que chega à Corte de Contas motivado para contribuir e aprender. “Começando por seguir o regimento interno da Corte e cumprir com muita determinação as atribuições”, disse.
Sérgio de Paula completou que espera contribuir para a modernização do controle externo, eficácia e transparência do Tribunal de Contas.
Que experiências da sua trajetória profissional considera mais úteis para o trabalho de conselheiro?
Sem dúvida, a interlocução que mantivemos com as prefeituras em todos os municípios, que me permitiu acumular conhecimentos sobre a realidade de cada cidade, a gestão dos investimentos e a relação do poder público. Por outro lado, o olhar técnico sobre finanças públicas, gestão orçamentária e contabilidade, é outra experiência fruto da minha formação, que procurei estar sempre atualizando e colocamos em prática na Associação dos Municípios de Mato Grosso do Sul (Assomasul) e no governo do Estado.
O Tribunal de Contas é, muitas vezes, visto como um espaço técnico ocupado por indicações políticas. Como pretende conciliar essas duas dimensões?
Não vejo o porquê de questionar um fato natural. O poder é constituído de agentes políticos, eleitos e designados e para quem comanda a gestão pública uma das principais prerrogativas é a nomeação, respeitando-se os princípios que todos conhecem, da transparência e da legalidade.
Diferentemente da nomeação por concurso público, a indicação política não torna o ocupante da função um servidor permanente, mudam com a alternância da administração. Por trás da indicação política tem o trabalho do escolhido e sua capacidade técnica de desempenhar a função.
O político, que também tem formação técnico-profissional, pode estar em ambiente técnico. Sobre o TCE, é uma instituição auxiliar do Poder Legislativo, independente enquanto Corte de Contas e atua de forma eficaz e harmônica, tendo em seus quadros servidores efetivos, de carreira, e provisórios altamente capacitados e experientes.
Quais serão suas principais prioridades neste início de atuação?
Creio que a questão não é ter ou não uma prioridade. Chego ao Tribunal para exercer o que é delegado a um conselheiro. Chego sim muito motivado para contribuir e aprender, começando por seguir o regimento interno da Corte e cumprir com muita determinação as atribuições.
Posso dizer que, entre as atribuições, vou me dedicar bastante na ação preventiva, aquela que se antecipa aos problemas e evitar lá na frente dissabores ao agente público ou prejuízos à população.
Acho que uma tarefa digna do Tribunal é estimular a formação de bons gestores públicos. É disso que as cidades precisam, de gestores que gastam com qualidade, de forma legítima e transparente.
O senhor acredita que o TCE-MS deve ser mais rigoroso ou mais orientador com prefeitos e gestores públicos?
Acho que não dá para desviar a atenção, é lógico que o Tribunal não é condescendente e o agente público está sujeito à lei. O julgamento de contas se dá sobre o que não condiz à lei e, por isso, pode haver punição rigorosa.
Eu diria que o Tribunal deve estar sempre atento e procurar sempre orientar. Vale também a iniciativa do gestor que, na dúvida, faz consultas ao Tribunal. A prevenção nos dois lados. Mas também penso que uma dose de rigor ajuda a inibir irregularidades.
Assim como são necessárias auditorias para garantir que não haja desvio de recursos, levando em conta que em toda gestão, os atos que implicam gastos, contratos, obras e programas sociais envolvem vários servidores.
Há áreas específicas do Estado ou dos municípios que merecem maior atenção da Corte neste momento?
Os problemas em geral passam pela gestão orçamentária e fiscal [nesse ponto é importante o trabalho educativo, para treinamento e capacitação de técnicos que operam a contabilidade pública].
De resto surgem muitos problemas na gestão de pessoal, folha de pagamento, licitações e contratos em compras governamentais. Todo gestor sabe que o Tribunal pune as irregularidades com o rigor da lei.
Muitas falhas que a gente tem conhecimento são de falta de controle interno, fáceis de resolver. Aí entra aquela ideia que comentei no início – promover a capacitação e manter as prefeituras atualizadas sobre a gestão dos recursos e dos serviços.
Que tipo de controle o senhor considera mais efetivo: o preventivo, que evite o erro, ou o punitivo, que pune após o dano?
As duas ações têm que andar juntas, se completam. A função do Tribunal é fiscalizar, inclusive pela prerrogativa de órgão auxiliar do Poder Legislativo, auditar, julgar e acatar ou rejeitar, aplicar sanções e determinar providências, no processo legal.
No conjunto das atribuições, prerrogativas e deveres, é muito importante a responsabilidade social, pois o Tribunal também tem o seu papel educativo, voltado aos jurisdicionados, de orientação e formação técnica, ajustando os quadros de servidores da área técnica nas prefeituras.
Transparência é uma cobrança crescente da sociedade. O que o senhor pretende fazer para aproximar o TCE-MS da população?
Penso que essa não é tarefa de apenas um dos conselheiros, mas da relação da instituição com a população. Será sempre boa, sendo ela movida pela transparência e também pelos resultados naquilo que é função primordial, que é fiscalizar o uso do dinheiro público, verificando a legalidade, legitimidade e economicidade.
É praxe e deve continuar sendo, naturalmente, a divulgação das ações do Tribunal, independentemente de personagem e camada de gestão onde se verifica irregularidade. É importante que haja transparência também em como o Tribunal retribui à sociedade a gestão do próprio orçamento.
O Tribunal pode se modernizar mais? Há espaço para uso de inteligência artificial, cruzamento de dados ou auditorias eletrônicas?
O ponto central é incentivar a responsabilidade fiscal, transparência e eficiência. Mas isso não se faz mais por métodos antigos e o avanço da tecnologia acabou impondo a todos, inclusive aos órgãos de controle externo, a necessidade de se modernizar.
O uso de inteligência artificial [IA] é uma tendência consolidada e em crescimento, visando otimizar processos, aprimorar a auditoria pública e aumentar a eficiência e transparência na gestão dos recursos públicos. Sem contar que também facilita a pesquisa de jurisprudência e a análise de processos similares, contribuindo para decisões mais consistentes e rápidas.
Agora é preciso também ver a questão da segurança, como a privacidade dos dados. Tudo isso implica também em mais investimentos em estrutura no Tribunal.
Em tempos de redes sociais e cobrança pública instantânea, o TCE-MS precisa comunicar melhor suas decisões?
Não vejo nenhum problema de comunicação do Tribunal com o público, que a rigor é feita por meio da internet, pelo portal e o órgão oficial de divulgação, o Diário do TCE, em versão eletrônica.
É lógico que esse processo de plataformização acaba colocando no mesmo plano a sociedade, setores públicos, corporações e todos os segmentos nas redes.
Acho que a disponibilização de canais instantâneos, nas redes sociais, é uma tendência, mas que também tem que estabelecer um serviço seguro, capaz de poder interagir com a população.
O senhor acredita que o TCE-MS precisa rever suas práticas de transparência?
Acabei de chegar, não sou eu quem vai dizer ou mensurar as práticas de transparência e necessidade de revisão. A direção do TCE sabe quando e onde pode melhorar, discutir plano. Há espaço para qualquer discussão, mas o que posso dizer é que não conheço nenhuma manifestação ou avaliação indicando a necessidade de mudar ou aprimorar.
O Tribunal de Contas pode ajudar Mato Grosso do Sul a ser mais eficiente no uso dos recursos públicos?
Sem dúvida. O TCE faz parte da rede de controle e dispõe de mecanismos de avaliação e aferição que servem para induzir a gestão pública a práticas que tornam os gastos públicos mais eficientes e com qualidade.
Ao estabelecer os conceitos de gestão, transparência, capacidade de investimentos, a rede de controle e, portanto, também o TCE, estimulam uma competição saudável entre as administrações, que são induzidas a adotar programas cada vez mais eficientes para a melhoria da gestão pública e obtenção de melhores resultados e impacto positivo para a população.
Como o TCE-MS pode contribuir para fiscalizar grandes obras e PPPs, como a Rota da Celulose e a Malha Oeste?
O Tribunal de Contas tem um corpo técnico bem qualificado e tenho certeza que pode criar grupos de trabalho para a fiscalização de projetos de grandes dimensões.
A sistematização de projetos da envergadura da Rota da Celulose e da Malha Oeste, além de contratos de longo alcance entre poder público e iniciativa privada não é uma coisa simples, e menos simples é o processo de fiscalização. Há desafios a serem superados, em razão da complexidade técnica dos empreendimentos.
Que legado o senhor gostaria de deixar ao final da sua trajetória no Tribunal?
Espero contribuir para a modernização do controle externo, eficácia e transparência da Corte de Contas.
Espero contribuir para a correta aplicação do dinheiro público. Se a minha contribuição para a Corte for uma cultura de gestão pautada pelo alcance social e desenvolvimento sadio dos municípios, estarei plenamente satisfeito e reafirmo o meu propósito de desempenhar esta nova missão com responsabilidade, dedicação e espírito público.
Perfil
Sérgio de Paula
Natural de Andradina (SP), casado e pai de três filhos, mudou-se para Mato Grosso do Sul ocupando cargos no antigo Banco Real, na cidade de Dourados, de onde se tornou secretário municipal de Fazenda. Formado em Ciências Contábeis, pós-graduado em Auditoria em Organização do Setor Público, MBA em Gestão Pública e Contabilidade Governamental, ele também foi assessor parlamentar na Assembleia Legislativa, presidente estadual do PSDB e atuou nos governos de Reinaldo Azambuja (PL) e de Eduardo Riedel (PP).
