O uso perigoso de tadalafila como pré-treino em academias

O uso perigoso de tadalafila como pré-treino em academias

Cresce o uso indiscriminado do medicamento para disfunção erétil por jovens saudáveis, impulsionado por modismos e desinformação, com riscos graves à saúde

A tadalafila , um medicamento originalmente desenvolvido para tratar a disfunção erétil , tem sido amplamente desviada de sua finalidade terapêutica e utilizado como “pré-treino” em academias. Essa prática, impulsionada pela busca por resultados rápidos e estéticos nas redes sociais, coloca em risco a saúde de jovens e adultos saudáveis.

Especialistas alertam que não há qualquer embasamento científico para justificar o uso da substância no contexto esportivo. Além disso, os riscos associados ao consumo indevido são graves e podem comprometer a saúde de forma irreversível.

O que é a tadalafila?

A tadalafila é um medicamento vasodilatador prescrito principalmente para tratar a disfunção erétil . Seu mecanismo de ação relaxa os vasos sanguíneos, aumentando o fluxo de sangue para áreas específicas do corpo. Apesar de ser altamente eficaz para sua função original, o uso recreativo ou fora de indicação médica pode causar sérios danos à saúde.

Segundo o urologista Clayton Franco Moraes , professor de medicina na Universidade Católica de Brasília (UCB) e doutor em ciências médicas, a ideia de que a tadalafila melhora o desempenho físico é equivocada:

“Não existe nenhuma evidência científica que comprove benefícios concretos no ganho de massa muscular ou no rendimento físico. O efeito vasodilatador pode gerar uma sensação temporária de músculos mais cheios, mas isso não se traduz em resultados reais.”

O mito do “pump” e seus perigos

O principal atrativo da tadalafila entre frequentadores de academia é o chamado “pump” , a sensação de vascularização muscular durante o treino. Esse efeito estético é resultado do aumento do fluxo sanguíneo causado pelo medicamento. No entanto, como explica o professor de educação física Thiago Rosa , também da UCB, especialista em medicina translacional:

“O ‘pump’ gerado pela tadalafila é puramente estético e temporário. Não há comprovação científica de que ele melhore o desempenho ou acelere o crescimento muscular. Essa prática é movida por modismos e informações truncadas da internet.”

Os riscos, no entanto, são reais e preocupantes. O uso inadequado da tadalafila pode causar:

  • Dor de cabeça
  • Queda de pressão arterial
  • Taquicardia
  • Alterações visuais
  • Desmaios durante o treino

Em ambientes de alta intensidade, esses efeitos podem ser ainda mais graves, especialmente quando combinados com outras substâncias, como estimulantes ou termogênicos. “Casos de síncope (desmaio) e arritmias cardíacas não podem ser descartados. É um risco desnecessário”, alerta Thiago Rosa.

Dependência psicológica e impactos a longo prazo

Além dos riscos físicos imediatos, o uso recreativo da tadalafila pode levar à dependência psicológica . Muitos usuários passam a acreditar que só conseguirão desempenho sexual ou físico adequado com o auxílio do medicamento.

“Essa crença gera um ciclo vicioso de insegurança e uso contínuo, mesmo sem necessidade”, explica Clayton Franco Moraes. “Não estamos falando de dependência química, mas sim emocional, que pode comprometer a autoestima e o bem-estar.”

Outros problemas graves incluem:

  • Complicações cardiovasculares, como infarto ou AVC
  • Priapismo (ereção prolongada e dolorosa)
  • Alterações visuais permanentes
  • Dores musculares persistentes
A cultura dos atalhos

O aumento alarmante nas vendas de tadalafila no Brasil – que saltaram de 21,4 milhões de caixas em 2020 para 47,2 milhões em 2023 – reflete uma combinação de fatores culturais e comportamentais. A romantização da performance física e sexual, exacerbada pelas redes sociais e pela cultura pop, é um dos principais motores dessa tendência.

“Músicas populares promovem o uso do medicamento como símbolo de virilidade. Influenciadores digitais divulgam o uso recreativo sem orientação médica, contribuindo para essa cultura perigosa,” aponta Clayton Franco Moraes.

A acessibilidade do medicamento genérico, com preços mais baixos, e a venda sem retenção de receita também facilitam o cenário. Para o professor Thiago Rosa, esse padrão está diretamente ligado à “cultura de atalhos” presente nas academias:

“A pressão por resultados rápidos e a estética supervalorizada nas redes sociais criam um ambiente fértil para o uso de substâncias inadequadas. Em vez de um processo gradual e saudável, muitos buscam soluções mágicas.”

Alternativas seguras para melhorar o desempenho

Diante dessa realidade, especialistas reforçam que as melhores estratégias para melhorar o desempenho físico e alcançar o “pump” muscular são baseadas em hábitos saudáveis e técnicas comprovadas cientificamente. Entre elas estão:

  • Treinar com consistência
  • Dormir adequadamente
  • Manter boa hidratação
  • Utilizar compostos naturais, como citrulina malato e nitratos presentes na beterraba

“Esses recursos são seguros e têm efeitos vasodilatadores comprovados quando utilizados corretamente,” sugere Thiago Rosa.

Papel dos profissionais de saúde e educação física

Profissionais de educação física têm um papel crucial na prevenção do uso indevido de medicamentos. Eles devem criar um ambiente de confiança com os alunos, onde dúvidas e inseguranças possam ser discutidas sem julgamentos.

“A melhor forma de atuar é com escuta, orientação e informação. Profissionais precisam estar atualizados para identificar e combater modas perigosas com base em evidências científicas,” conclui Thiago Rosa.

O trabalho conjunto entre médicos, nutricionistas e educadores físicos é essencial para oferecer cuidados integrais e garantir a segurança dos praticantes de atividades físicas.

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